Gatinho Preto de Machado de Assis

O gato preto de Machado de Assis
Nascido no dia 21 de junho de 1839, no Morro do Livramento, Rio de Janeiro (então capital do Império do Brasil), filho de um pintor de paredes, mulato, e de uma lavadeira de origem açoriana, Machado de Assis é considerado o mais importante escritor da literatura brasileira. Fundador da Academia Brasileira de Letras, terá desde cedo enfrentado o preconceito racial e social. Singular e polifacetada, a sua obra percorre todos os gêneros literários, desde a crônica ao romance, do folhetim ao libreto de ópera, passando pela poesia, pela crítica e pelo comentário político.

Machado de Assis não teve filhos, mas alguns dos seus textos revelam-nos muitas infâncias e crescimentos difíceis. Conta-se ainda que Machado de Assis e sua mulher, Carolina, tinham uma cadela chamada Graziela. Carolina alimentava-a com sopas de leite e tricotava-lhe casaquinhos de lã. Após a morte da cadela, certo dia, em 1883, e morando o casal no nº. 18 da Rua do Cosme Velho, uma menina de 12 anos, sua vizinha, ter-lhes-á oferecido um gatinho. Eis aqui a deliciosa carta de agradecimento que o escritor enviou, escrevendo em nome do próprio bichano:


D. Alba,

Só agora posso pegar na pena e escrever-lhe para agradecer o obséquio que me fez mandando-me de presente ao velho amigo Machado.

No primeiro dia não pude conhecer bem este cavalheiro; ele buscava-me com palavrinhas doces e estalinhos, mas eu fugia-lhe com medo e metia-me pelos cantos ou embaixo dos aparadores.

No segundo dia já me aproximava, mas ainda cauteloso. Agora corro para ele sem receio, trepo-lhe aos joelhos e às costas, ele coça-me, diz-me graças, e, se não mia como eu, é porque lhe custa, mas espero que chegue até lá.

Só não consente que eu trepe à mesa, quando ele almoça ou janta, mas conserva-me nos joelhos e eu puxo-lhe os cordões do pijama.

A minha vida é alegre. Bebo leite, caldo de feijão e de sopa, com arroz, e já provei alguns pedaços de carne. A carne é boa; não creio, porém, que valha a de um camundongo, mas camundongo é que não há aqui, por mais que os procure. Creio que desconfiaram que há mouro na costa, e fugiram.

Quando virá ver-me? Eu não me canso de ouvir ao Machado que a senhora é muito bonita, muito meiga, muito graciosa, o encanto de seus pais.

E seus pais, como vão? Já terão descido de Petrópolis? Dê-lhes lembranças minhas, e não esqueças este jovem…

Ass: Gatinho Preto.


Publicada pela primeira vez no artigo “Radiografia de Machado de Assis”, da autoria do Professor Gladstone Chaves de Melo (1917-2001), datado de outubro de 1986, na Carta Mensal, editada pelo Orgão do Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio.

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